terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Como de costume

Show na praia no Ano Novo, não de Ano Novo. Eles estavam sentados bem na minha frente, separados apenas pela filha, pouco mais que uma adolescente, mas podia ser uma, jogando ao celular no meio da multidão. Não era propriamente uma multidão, era uma centena ou duas de pessoas, talvez mais, continuo horrível em cálculos.

Era um casal de velhos, mas podia não ser, tinham apenas cinquenta e poucos anos cada. Num dado momento, antes mesmo do início do show, ele afastou sua cadeira da delas, esposa e filha, como que com desconhecidas, nada avisou. Quase aviso eu, tamanho o constrangimento estampado no rosto da mulher quando percebeu. Mas não disse nada, nem sequer o chamou. Pensei que o costume a deixara assim, ele devia se afastar, sempre.

Ele ainda piorou, fechou a cadeirinha dobrável estilo  diretor de cinema e galgou um lugarzinho mais na frente, mais distante delas. O constrangimento dela aumentou, ele não notou, a filha ao celular não notou, mas nós duas sim, ela mais do que eu.

Quando o cara da banda cantou "O homem de gelo", ela sabia que ele olharia. Eu também olhei, sabia que ela olharia, e ele, por identificação ou falta de interesse na canção, olhou. E ele acenou e ela jogou um beijo no ar, ficou tudo bem, estava combinado que ele se afastaria, mas ficaria presente o suficiente, apenas o necessário pra manter o costume.

Eu estava gostando do show, talvez mais que a maioria da platéia burguesa demais pra gostar da tal banda alternativa, mas burguesa demais pra admitir que não estava gostando tanto assim. No final, o músico nos encaminhou por um repertório fácil, que todos conheciam e gostavam mesmo, isso era verdade, mas já estava combinado, era pra manter o costume, para não dar errado.

O Ano era Novo, mas nada tão Novo que quebrasse a regra, o jogo. As pessoas fazem novas promessas, mas elas mesmas, não tão novas, preferem o habitual, é o que podem e isso não é uma crítica. O mínimo do comum deve se manter, pra juntar  com o certo e não dar errado. Se não, de onde tirar o novo certo?  O que deu errado, transformado, é o novo certo e eu concordo que seja assim. Mas a mulher, sentada logo alí, concorda mais do que eu, ela concorda sempre, pra manter o costume.

Um comentário:

  1. Oi, Kenia! Prazer estar visitando teu blog novamente. Parabéns pelo texto! Beijo carinhoso...

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